Almeida acaba de ter seu mandato cassado mas deve recorrer |
Numa decisão tomada na tarde dessa quarta-feira (3), o juiz eleitoral da Comarca de Canavieiras acaba de acatar o pedido do Ministério Público Eleitoral, e cassar o diploma do prefeito Dr. Roberto almeida e seu vice Medradinho.
A tomada de decisão do Magistrado ocorreu após uma ação do ministério Público Eleitoral acusando o gestor de Abuso do Poder Econômico e compra de votos nas eleições de outubro passado.
De acordo com a Legislação, a decisão do Magistrado ainda cabe recurso, e o gestor pode aguardar novo julgamento (dessa vez por colegiado), no cargo de prefeito. Contudo, de acordo com os exemplos das decisões e julgamentos que estão acontecendo em todo o Brasil, o novo julgamento do prefeito de Canavieiras deve acontecer num prazo em torno de 60 dias. Caso a sentença seja mantida como tem sido de costume, será convocado uma nova eleição para Canavieiras.
SENTENÇA
Proc. Nº 002-70.2016.6.05..0116 - AIME
Impugnante: MPE
Impugnados: Clóvis Roberto Almeida de Souza e outro
O MPE ingressou com a presente AIME em face dos impugnados , respectivamente candidatos eleitos e já empossados aos cargos de prefeito e vice-prefeito do município de Canavieiras.
Alega que eles tiveram a prestação de contas rejeitada por ter surgido, após cruzamento de dados com outros órgãos pelo sistema SPCE, a informação da emissão da nota fiscal nº 60 pelo Posto de Combustível União Sertório Comércio Varejista de Derivado de Combustíveis LTDA - ME, no valor de R$ 20.000,00, em nome do primeiro impugnado.
Que ao ser notificado sobre a descoberta o primeiro impugnado apresentou retificação afirmando que a emissão da nota teria se dado de forma equivocada, posto que tal gasto teria sido feito por seu partido político.
Todavia, tampouco tais gastos teriam figurado na prestação de contas partidária.
Que o montante de R$ 20.000,00 além de alto por representar mais de 80% do valor total de despesas registradas na campanha, ainda coincide com a reta final da campanha e se trata de combustível, coincidindo com o momento em que os candidatos faziam suas carreatas.
Que agindo assim os impugnados desobedeceram a lei no que se refere à arrecadação e gastos de recursos.
Requer a cassação dos diplomas e dos mandatos dos impugnados.
Com a inicial apresentou documentos.
O impugnado Clóvis apresentou defesa a fls. 84 a 95. Deixo de escrever os fatos e argumentos apresentados na peça de defesa porque ela terá de ser retirada dos autos.
O segundo impugnado deixou transcorrer em branco o prazo para resposta.
A fls. 238 e 239 requerimento da Coligação Uma Nova Canavieiras é Possível para acompanhar o feito, o que foi deferido.
O MPE apresentou réplica a fls. 243 a 248. Tendo em vista a ineficácia da defesa, desnecessário pormenorizar a réplica.
A fls. 261 a 280 audiência de instrução onde foram ouvidas as testemunhas arroladas pelas partes.
A fls. 290 a 302 alegações finais do MP requerendo a procedência do pedido. Requer a revelia do impugnado Clóvis em razão da peça de defesa ter sido assinada por advogada sem poderes.
No mérito afirma que os fatos afirmados na inicial restaram provados e pede a procedência do pedido.
O impugnado Clóvis apresentou alegações finais a fls. 308 a 359 suscitando preliminarmente a nulidade do feito em razão de não ter sido suspenso o processo para aguardar o trânsito em julgado do processo de prestação de contas.
Suscitou também a nulidade do feito por ter sido deferida a substituição de testemunha na AIJE que lhe move coligação adversária. Também afirma ter havido nulidade no deferimento do pedido de que a coligação adversária presenciasse os atos processuais desta AIME.
No mérito pugna pela improcedência do pedido afirmando que a nota fiscal nº 60 foi emitida por equívoco em nome do réu, que a mesma foi cancelada, que nada se provou a respeito de qualquer prática pelo impugnado que tenha violado o regramento eleitoral e que a prova testemunhal é frágil e fraca.
A fls. 361 a 363 alegações finais do segundo impugnado afirmando que nada se provou a respeito deste ter praticado qualquer ato ilegal, requerendo a improcedência do pedido em relação a ele.
É o breve relatório.
Decido.
Em primeiro lugar cumpre esclarecer que a defesa de fls. 84 a 95 é ato ineficaz e deve ser desentranhada dos autos. A defesa vem assinada pela advogada Bianca Ribeiro Grancheux Barbosa. Não há nos autos nenhuma procuração nem instrumento de substabelecimento em nome dela.
A parte impugnada foi intimada pelo despacho de fls. 252 verso para regularizar sua representação processual, mas ainda assim nem procuração nem substabelecimento em nome desta advogada foi juntado.
Dispõe o art. 104 inc. II do CPC que "o ato não ratificado será considerado ineficaz àquele cujo nome foi praticado..."
Desta forma, a defesa é ineficaz e deve ser desentranhada dos autos.
Em que pese a ausência de defesa de ambos os impugnados, não se deve aplicar o efeito da revelia de se aceitar como verdadeiros os fatos narrados, pois se trata de matéria referente à soberania popular e ao exercício do direito de voto. Os impugnados foram escolhidos pelo voto e somente se cabalmente provados os fatos deverão perder os mandatos.
Como embora sem contestar os impugnados ingressaram no processo a partir da audiência de instrução e visando atender ao princípio constitucional da ampla defesa, passo a analisar as questões preliminares suscitadas nas alegações finais do impugnado Clóvis.
A alegação de nulidade em razão da não suspensão do processo para aguardar o trânsito em julgado da decisão do processo de prestação de contas não merece acolhida porque já havendo sentença a questão prejudicial perde o condão de suspender processo em andamento, em especial porque nos termos do art. 257 do Código Eleitoral os recursos não possuem efeito suspensivo.
Além do mais, a rejeição das contas não engloba todo o mérito do pedido do MPE. A rejeição das contas se deu em relação à descoberta de uma nota fiscal de despesa não declarada pelo impugnado na sua prestação de contas. A partir do descobrimento desta nota fiscal o MPE ingressou com o presente pedido alegando ter havido abuso do poder econômico através da prática de conduta ilícita, afirmando na inicial que a despesa se refere a combustível possivelmente distribuído irregularmente.
Assim, a emissão da nota fiscal é apenas um indício dos fatos afirmados pelo MP. O mérito da presente ação não se resume à emissão da nota fiscal não declarada.
A alegação de nulidade da AIME porque foi deferida a substituição de uma testemunha na AIJE não deve ser acatada. Quando da audiência de instrução desta AIME as partes concordaram com o empréstimo das provas, sendo que admitiram que se transpusessem os depoimentos prestados na AIJE para a AIME.
No momento em que concordou com o empréstimo das provas o impugnado Clóvis não fez nenhuma ressalva quanto ao empréstimo do depoimento da testemunha que tinha substituído a testemunha Alexsandra Soares da Silva.
A alegação de nulidade por violação ao segredo de justiça tampouco deve ser acolhida. O segredo de justiça não é absoluto. No caso da Coligação Uma Nova Canavieiras é Possível, é evidente o interesse da mesma no processo, a uma porque baseada nos mesmos fatos move uma AIJE em face dos impugnados e a duas porque concorreu contra os impugnados no processo eleitoral e saiu derrotada.
O segredo de justiça não pode ser oposto àqueles que tem interesse jurídico no feito.
No mérito os fatos narrados na inicial restaram demonstrados cabalmente.
A testemunha Mário Cley afirmou que trabalhou na campanha dos impugnados na coordenação e afirmou que ocorreu distribuição de combustível gratuito para eleitores, em especial aos que acompanhavam as carreatas dos candidatos.
Esclareceu de forma detalhada como funcionada a distribuição. Disse que era elaborada uma lista com o nome das pessoas que poderiam abastecer. Que tais listas eram elaboradas pelos senhores Edmo e Gilmar que as enviavam ao posto de gasolina.
Que além das listas também havia distribuição de vales por parte do senhor Guerra, tesoureiro da campanha, que consistiam num papel escrito com a quantidade de combustível que o portador poderia abastecer no posto.
Esclareceu que o abastecimento gratuito não se limitava àqueles que trabalhavam na campanha, mas também aos eleitores, inclusive disse que quando haviam eventos da campanha, antes dos mesmos ocorria distribuição de combustíveis para aqueles que iam participar dos eventos.
Afirmou que houve uma carreata da qual participaram cerca de 250 carros, onde aproximadamente 80% deles tinham sido abastecidos gratuitamente. Bem como ocorreu uma passeata com números semelhantes de abastecimentos gratuitos.
A testemunha Gilmar Avelar disse que também era coordenador da campanha dos impugnados, sendo que era quem coordenava as carreatas. Afirmou ter havido durante a campanha distribuição gratuita de combustível para carros e motos de eleitores.
Disse que tinha uma lista com 258 veículos dos quais cerca de 150 os donos receberam combustível de graça. Que a distribuição era toda feita pelo Posto União que pertence a Rosalvo Sertório.
Confirmou que havia a lista no posto com a relação de veículos autorizados e que também havia a distribuição de vales para alguns eleitores que gozavam de maior confiança.
Acrescentou que autorizações para abastecimento gratuito também eram dadas por telefone, quando o tesoureiro da campanha ou algum coordenador informavam ao posto quem estaria autorizado a abastecer.Disse também que todo domingo cerca de 50 carros se deslocavam para a zona rural e recebiam de graça de 10 a 15 litros de combustível.
Que nas semanas que haviam bate papos cerca de 50 carros e de 70 a 100 motos recebiam combustível gratuito.Que nas carreatas cerca de 200 motos chegavam a receber combustível gratuito.
Que durante a campanha foram de 8 a 10 visitas no interior e entre bate papos e comícios cerca de 12 a 17.
A testemunha José Fernandes afirmou que não trabalhava na campanha dos impugnados e que após ser informado por um amigo chamado Wellington de que estavam distribuindo combustível de graça no Posto União, foi até o local onde conseguiu abastecer sua moto com R$ 40,00 de gasolina. Que em troca teve de colocar em sua moto um adesivo do candidato Clóvis para prefeito.
Disse também que no referido posto havia muita gente abastecendo de graça. Que bastava ter o adesivo do candidato Clóvis que recebia combustível de graça.
A testemunha Hipólito disse que seu filho Fabrício recebeu de graça 20 litros de combustível para o carro dele. Que ele também teve que colocar o adesivo do candidato para receber o combustível.
Que sabe de diversas pessoas que receberam combustível de graça.
Por fim, o dono do posto de gasolina, Rosalvo Sertório, admitiu que durante a campanha dos impugnados seu estabelecimento abastecia veículos de pessoas por conta da campanha destes. Que o coordenador de campanha Edmo Nascimento e o tesoureiro da campanha Guerra eram os responsáveis por indicar quais veículos poderiam ser abastecidos.
A prova testemunhal deixa claro que os impugnados fizeram uso abusivo do poder econômico, distribuindo gratuitamente combustível para eleitores.
A alegação da defesa do impugnado Clóvis de que a nota fiscal nº 60 foi emitida por equívoco não se sustenta diante da confissão do próprio sócio administrador da empresa de que de fato ocorreu distribuição de combustível por conta do candidato a terceiros.
A prova testemunhal, ao contrário do que preconiza a defesa que a chamou de fraca e frágil, é robusta, detalhada, substancial. Há dois coordenadores de campanha dizendo que havia distribuição gratuita de combustível por conta da campanha dos impugnados, foram ouvidas uma pessoa que se beneficiou e uma cujo filho se beneficiou, sendo que ambas atestaram que várias pessoas se beneficiaram e finalmente, o próprio dono do posto confirmou a distribuição gratuita financiada pela campanha dos impugnados.
Diante deste conjunto probatório, a afirmação do impugnado Clóvis de que nunca ocorreu o consumo consubstanciado pela nota fiscal nº 60 se mostra inverídica. O consumo restou cabalmente provado. O réu omitiu este gasto da campanha porque ele se destinou a distribuição gratuita de combustível para os eleitores.
Comprovada a farta distribuição gratuita de combustível para eleitores, conclui-se ser evidente o potencial lesivo da conduta ilícita em ferir a lisura do processo eleitoral. Há duplo potencial em desequilibrar a paridade de armas entre os candidatos. Aquele que recebe o combustível de graça tende a votar no candidato que lhe beneficiou como retribuição e além disso, inflando o número de carros e motos que participam de sua carreata, o candidato passa ao eleitorado a imagem de que conta com o apoio da maioria, o que certamente influencia na intenção de votos de muitos.
Importante esclarecer que não é necessário que se prove que a conduta ilícita de fato influenciou o resultado da campanha, até porque diante do voto secreto tal prova seria impossível. Basta para a condenação que se demonstre o potencial lesivo da mesma e no presente caso, como esclarecido no parágrafo anterior, não há dúvidas de sua existência.
A conduta dos impugnados se amolda perfeitamente ao quanto previsto no art. 30-A da lei 9.504/97, uma vez que foi demonstrada a conduta em desacordo com a lei no que se refere a captação e gastos de recursos.
Enquadrada a conduta no tipo legal, há de se aplicar a punição prevista na lei, qual seja, a cassação do diploma e por consequência, a cassação do mandato.
A campanha para prefeito e vice é única. A chapa concorre junto e da sorte de um candidato depende a sorte do outro. Não há como se dissociar as campanhas, há uma campanha só. Independente de quem tenha praticado a conduta ilícita, ambos dela se beneficiaram. Assim, provada a conduta, a decisão de cassação deve abranger os dois impugnados.
Ante o exposto, julgo procedente o pedido para cassar os diplomas e os mandatos dos impugnados Clóvis Roberto Almeida de Souza e Carlos Alberto Medrado Filho como incursos na sanção prevista no art. 30-A par. 2º da lei 9.504/97.
P. R. I.
Retire-se dos autos a contestação de fls. 84 a 95 e todos os documentos que a acompanham.
Canavieiras, 03/05/17.
EDUARDO GIL GUERREIRO
Juiz Eleitoral
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