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segunda-feira, 27 de julho de 2020

Pequena Perereca podem ser uma grande arma contra o Mosquito da Dengue

“Apesar de medirem apenas quatro centímetros, elas são as gigantes do gênero”.  É desta maneira que o pesquisador Mirco Solé, da Universidade Estadual de Santa Cruz (Uesc), descreve uma das novas espécies de pererecas descobertas recentemente no Sul da Bahia, mais precisamente na Estação Ecológica de Wenceslau Guimarães, que podem auxiliar no combate ao mosquito Aedes aegypti.

O Sul da Bahia possui uma das maiores riquezas de anfíbios do mundo, entretanto, segundo Mirco, essa diversidade continua subestimada e inúmeras espécies aguardam para serem descobertas, como foi o caso das pererecas Phyllodytes amadoi, Phyllodytes praeceptor, Phyllodytes megatympanum, Phyllodytes magnus e Adelophryne michelin, descritas em seu trabalho de pesquisa intitulado “Desvendando a diversidade de anfíbios das áreas de altitude da Mata Atlântica do Sul da Bahia com ferramentas de taxonomia integrativa”.
Apoiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e pela Fundação de Amparo à Pesquisa da Bahia (Fapesb), o projeto busca mapear as espécies de dois gêneros de anfíbios muito pequenos utilizando todas as evidências possíveis, desde os dados genéticos até os morfológicos. “Conseguimos descrever cinco espécies novas para a ciência. Sabemos que ainda existem muitas outras desses dois gêneros para descrever e, antes da finalização da pesquisa, ainda queremos descrever no mínimo mais duas espécies”, destacou o cientista que chegou na Bahia há 14 anos, após um período pesquisando anfíbios na Serra Gaúcha.



 

Equipe de pesquisadores.

Mirco destaca que, das aproximadamente 80 espécies de anfíbios registradas naquela época no Rio Grande do Sul, na maioria era possível detectar o canto de anúncio e identificar o girino. “Durante as primeiras atividades de campo no Sul da Bahia, percebi rapidamente que o conhecimento adquirido no Sul do país ia me servir bem pouco aqui, pois não conseguia nem associar um nome a muitas das espécies que encontrava, muito menos os sons ou os girinos. Rapidamente ficou claro que para desvendar a incrível diversidade de anfíbios desse território, eu teria que trabalhar com taxonomia integrativa, coletando e analisando todos os pedaços de evidência possíveis para depois juntá-los como se fosse um quebra-cabeça”, disse.

O trabalho, segundo o autor, vai além da descrição das espécies e busca entender o lugar que elas ocupam no meio ambiente, ou seja, de que se alimentam, quais substratos ocupam e como se reproduzem. “O gênero de anfíbios que mais nos surpreendeu pela quantidade de espécies ainda desconhecidas foi o das pererecas-de-bromélia. Estes pequenos anfíbios têm sua história de vida intimamente ligada às bromélias, pois vivem, se alimentam e reproduzem nelas, enquanto os girinos se desenvolvem na água que fica acumulada nas axilas destas plantas. É nesta água também que se desenvolvem larvas de mosquito, as quais pelo menos duas dessas espécies são  comprovadamente capazes de caçar enquanto girinos, por isso atuam como biocontroladores de mosquitos. Em áreas onde as bromélias estão ocupadas por pererequinhas, a densidade de larvas desses insetos é baixa. Já em áreas onde esses anfíbios foram exterminados por meio da ação de larvicidas, após uma queda inicial no número de mosquitos, tende a acontecer um aumento desenfreado, pois as pererecas não estão mais exercendo seu papel”, declarou.

Esta problemática ambiental pode resultar no aumento de doenças transmitidas por mosquitos como dengue, zika e chikungunya. “Caso a devastação no habitat delas aumente, existe uma chance de o número de pessoas acometidas por essas doenças aumentar”, alertou Mirco, trazendo o conceito de que é necessário conhecer para preservar. “Uma espécie que ainda não foi descoberta não vai se tornar potencial fonte de princípios bioativos para desenvolver um remédio. Por exemplo, anfíbios que se alimentam quase exclusivamente de formigas, precisam se desfazer de substâncias que as formigas usam para se defender, como o ácido fórmico. Anfíbios podem secretar essas substâncias pela pele se tornando impalatáveis ou até venenosos. E essas substâncias podem conter princípios que, num futuro, podem ser empregados para desenvolver remédios”, disse.

O projeto está na sua fase final, porém, como depende de trabalhos de campo intensos, algumas das atividades principais estão paradas devido à pandemia da Covid-19. “Apesar das novas espécies encontradas, para cada resposta descoberta, aparecem dez novas perguntas, por isso ainda temos muito trabalho pela frente. Antes de finalizar o projeto em 2021, ainda pretendemos descrever mais duas espécies de pererequinha-de-bromélia e entender se apenas uma ou algumas espécies deste gênero conseguem atuar como biocontroladores de mosquitos ou se é uma características dos girinos de todas as espécies do gênero”, completou.

A pesquisa contou com a participação dos pesquisadores Victor Orrico, Amanda Santiago, Iuri Dias e Euvaldo Marciano Jr, todos da Uesc, Santiago Castroviejo da Pucrs e Judit Vörös do Museu Húngaro de História Natural. Além do apoio do CNPq e da Fapesb, o projeto contou também com o apoio da Fundação Grupo Boticário e da empresa Plantações Michelin da Bahia.

 


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