A Sociedade Brasileira
para o Progresso da Ciência (SBPC) promoveu hoje (7) uma “marcha virtual” pela
ciência. O objetivo da iniciativa é chamar a atenção de autoridades e da
sociedade para a importância da pesquisa no país e do fortalecimento de
políticas públicas de apoio à construção de conhecimento científico, como o
aumento de investimentos e ampliação da estrutura para essa prática.
Em razão da marcha,
o ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, Marcos
Pontes, divulgou nos canais de redes sociais da pasta um vídeo anunciando que o
governo está investindo de R$ 100 milhões em ações relacionadas à pesquisa
para combate à covid-19. Pontes acrescentou que foram liberados ontem R$ 352
milhões para laboratórios de biossegurança nível quatro, que podem contribuir
com pesquisas para enfrentar novas pandemias. Além disso, estão sendo aportados
mais R$ 600 milhões pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) para essa
finalidade.
Fortalecimento da
ciência
A “marcha” consistiu em diversos debates virtuais
sobre temas variados, da pandemia aos desafios da ciência, tecnologia &
inovação (CT&I), passando por discussões sobre temas contemporâneos.
Em um desses debates, representantes das principais
entidades do setor apontaram a necessidade de fortalecer as políticas voltadas
à CT&I. O presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Luiz
Davidovich, ressaltou que a pandemia está trazendo uma reavaliação do papel do
Estado e das instituições de CT&I.
“Estas instituições têm demonstrado força
fantástica. Universidades adaptando laboratórios para enfrentar crise. Isso
mostra que apesar dos cortes sucessivos a ciência está viva enfrentando as
emergências que aparecem”, comentou.
O pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz Carlos
Gadelha apontou como a pandemia evidencia as limitações da CT&I no país,
mencionando como exemplo o fato de o país gastar em importações, royalties
e transferência de tecnologia US$ 20 bilhões na área de saúde, quase o
equivalente ao orçamento do ministério (que segundo a Lei Orçamentária Anual de
2020 é de R$ 125,6 bilhões).
“Nosso gasto em saúde não está gerando riqueza no
país. Na área de ventiladores, nossas importações quintuplicaram nos últimos 20
anos. Temos que ficar de joelhos para comprar componentes. Na área de fármacos,
94% dos que a gente precisa são importados. A gente não pode apenas vender
produtos primários e não gerarmos conhecimento nesse país”, destacou.
Desafios
Esse cenário na saúde ilustra os desafios da
produção de conhecimento no Brasil assinalados pelos participantes do debate. O
Brasil é atualmente o 11º país no ranking global em produção científica.
O país possui 200 mil pesquisadores, número que na proporção por 1 milhão de
habitantes fica abaixo de diversas nações, como Argentina, Estados Unidos, os
países da União Europeia, Coreia do Sul e Israel.
O presidente da SBPC, Ildeu Moreira, destacou que o
orçamento das principais instituições e fundos da área diminuiu a menos da
metade nos últimos sete anos. O do Ministério de Ciência, Tecnologia Inovações
e Comunicações (MCTIC) chegou a R$ 8 bilhões em 2013 e agora está em R$ 3,5
bilhões. A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes),
responsável por bolsas de pós-graduação, teve o orçamento reduzido de R$ 7,4
bilhões para R$ 3,2 bilhões no mesmo período.
O Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (FNDCT) está com mais de 90% do recurso contingenciado. O fundo foi
ameaçado pela proposta de emenda à Constituição que extinguia diversas fontes
de receita deste tipo. Mas durante a tramitação no Congresso, que ainda não foi
concluída, o FNDCT foi retirado da proposta após pressão das entidades de
pesquisa.
“O grande desafio é que CT&I esteja integrada
em um projeto de nação. Que seja democrático, soberano, menos desigual e com
desenvolvimento sustentável. Podemos fazer mais se tivermos apoio e encaixados
em um projeto de nação. Podemos melhorar? Sim, mas precisamos estar inseridas
neste projeto”, defendeu o presidente da entidade.
Para o presidente do conselho das fundações de
amparo à pesquisa estaduais, Fábio Gomes, o país está perdendo a oportunidade
de contribuir com o esforço mundial de colocar a ciência para combater a pandemia
do novo coronavírus. “Apesar de a comunidade acadêmica estar à disposição
lutando, no âmbito local, do ponto de vista federal não há movimento neste
sentido. Há ao contrário, de negar a realidade e ela ser construída sob falsas
premissas”, opinou.
A presidente da Associação Nacional de
Pós-Graduandos, Flávia Galé, acrescentou à lista das medidas em anos recentes
sucessivos cortes de bolsas. Ela lembrou que o valor das bolsas de
pós-graduação não é reajustado há sete anos. “Esta não é benesse, mas remuneração
fundamental. Não se faz ciência só com laboratório, mas com pesquisadores”,
comentou.
A Agência Brasil entrou em contato com o
MCTIC perguntando sobre a redução orçamentária questionada pelas entidades
científicas e aguarda resposta.
Inovação
A diretora de Inovação da Confederação Nacional da
Indústria (CNI), Gianna Sagazio, defendeu maior aplicação dos conhecimentos em
soluções industriais. Ela lembrou que o Brasil ficou na 66ª posição no Índice
Global de Inovação em 2019 e não está investindo no setor como outras nações.
“O que está ocorrendo nos EUA, Europa, China é que
existe um reconhecimento pelo governo e sociedade que investir em CT&I é
prioridade e é vetor para o desenvolvimento. A este reconhecimento corresponde
à disponibilização de instrumentos, a formulação de políticas e recursos
financeiros sustentados ao longo dos anos. A OCDE [Organização para a
Cooperação e Desenvolvimento Econômico] tem investido em P&D acima de 2% do
PIB. No Brasil, até o último dado disponível temos menos de 1,3% do PIB”,
exemplificou Gianna Sagazio.
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